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É possível responsabilizar penalmente Greenwald?

  • Foto do escritor: Francisco Ilídio Ferreira Rocha
    Francisco Ilídio Ferreira Rocha
  • 26 de jul. de 2019
  • 3 min de leitura

Atualizado: 27 de jul. de 2019




1. O CASO


No contexto da Operação Spoofing, a Polícia Federal prendeu no dia 23 de julho de 2019 quatro pessoas suspeitas de invadir telefones de autoridades, incluindo o ministro da Justiça, Sérgio Moro (FONTE).


Um deles, Walter Delgatti Neto, afirmou em depoimento que teria invadido o celular de Sérgio Moro e outras autoridades e que teria repassado ao site The Intercept Brasil mensagens trocadas entre procuradores da Lava-Jato e pelo ministro da Justiça.


2. AS QUESTÕES.


2.1. Quais seriam os enquadramentos típicos dos hackers neste caso?


2.2. Seria possível responsabilizar criminalmente Glenn Greenwald, editor do Intercept Brasil, pela divulgação das mensagens?


3. AS RESPOSTAS.


Sobre o enquadramento típico da conduta dos supostos hackers, se as informações apresentadas pelos meios noticiosos forem corretas, trata-se a conduta do delito de invasão de dispositivo eletrônico (art. 154-A do Código Penal).


Art. 154-A.  Invadir dispositivo informático alheio, conectado ou não à rede de computadores, mediante violação indevida de mecanismo de segurança e com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização expressa ou tácita do titular do dispositivo ou instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita: Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.


O crime em comento exige que a invasão seja realizada com a especial finalidade de obter alguma vantagem ilícita (dolo específico). Note-se que na forma simples, o crime se consuma como a mera invasão, driblando mecanismos de segurança, não sendo necessário que obtenham ou divulguem nada do que consta no dispositivo. Porém, convém notar que, uma vez que através da invasão os hackers teriam obtido o conteúdo de comunicações privadas, o delito de invasão de dispositivo eletrônico será qualificado, nos termos do art. 154-A, §3º, do Código Penal. Acaso dentre as mensagens ilegalmente obtidas constarem informações sigilosas assim classificadas nos termos da Lei n. 12.527/2011, o delito também será considerado como qualificado. 


§ 3º Se da invasão resultar a obtenção de conteúdo de comunicações eletrônicas privadas, segredos comerciais ou industriais, informações sigilosas, assim definidas em lei, ou o controle remoto não autorizado do dispositivo invadido:

Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, se a conduta não constitui crime mais grave.


Assim, a forma qualificada estaria consumada com a mera obtenção do conteúdo de comunicação eletrônicas privadas, não sendo necessário a divulgação. Por outro lado, se além de obter o conteúdo das mensagens, os criminosos procedam à divulgação, comercialização ou transmissão de tais conteúdos para outras pessoas, então, nessa situação, termos a aplicação de causa de aumento de pena.  Neste cenário, verifica-se uma majorante de pena de 1/3 a 2/3 (art. 154-A, §4º, CP), uma vez que - conforme depoimentos - os dados obtidos foram transmitidos a terceiros, a saber, os jornalistas do Intercept Brasil. Ainda, levando em consideração que dentre as vítimas da invasão encontram-se diversas autoridades, entre elas o Presidente da República e o Presidente da Câmara, aumenta-se a pena de 1/3 até a 1/2, conforme estabelece o disposto no art. 154-A, §5º, do Código Penal. Importante destacar que, uma vez que essas causas de aumento de pena são descritas na parte especial, o juiz limitar-se-á a um só aumento, prevalecendo a causa que mais aumente ou diminua (art. 68, parágrafo único, CP), podendo a outra ser utilizada, como agravante ou circunstância judicial durante o cálculo da pena.


Considerando que, de acordo com a Polícia Federal, os agentes praticaram o crime de invasão de dispositivo eletrônico diversas vezes contra diversas vítimas, afirma-se na situação um concurso de crimes. Conforme as particularidades de como os crimes foram perpetrados, poderá ser um cenário de concurso material (art. 69, CP), ou, sendo provável que existam semelhanças, especialmente em relação ao modo de execução, tratar-se-á de crime continuado (art. 71, CP).


E em relação a Greenwald? Sendo verdadeiras as informações apresentadas pelo hacker em depoimento, as mensagens foram enviadas para o Intercept Brasil anonimamente e sem qualquer contraprestação pecuniária.


Neste caso não existiria possibilidade de responsabilidade penal de Greenwald, uma vez que o jornalista está plenamente acobertado pela garantia constitucional do direito de liberdade de expressão (art. 5º, IV, CF) e de liberdade de imprensa (art. 5º, IX, CF). Além disso, convém destacar que o art. 5º, XIV da Constituição Federal é categórico ao estabelecer o direito de informar e ser informado, preservando o sigilo da fonte quando necessário para o exercício profissional. Sendo assim, Greenwald não pode ser obrigado a revelar ou confirmar a identidade daquele que lhe entregou as compilações de mensagens.


Somente seria possível dizer da responsabilidade penal do jornalista naquela hipótese no qual ele próprio induziu, instigou ou determinou a prática do delito previsto no art. 154-A do Código Penal, como se daria no caso de ter encomendado aos hackers que invadissem o dispositivo desta ou daquela autoridade. Nessa situação afirmar-se-ia seu enquadramento enquanto partícipe (induzimento/instigação) ou coautor (mandante), conforme determina o art. 29 do Código Penal.



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